Então vamos a aventura: Na boleia de um caminhão

Sexta-feira, sempre as sextas, tive uma aula no modulo de produção que necessitávamos ir a San Antonio, uma província aqui pertinho da escola, encontrar uma locação que fosse adequado para o roteiro de um curta que estávamos trabalhando.

Nesse dia, como em todos desse módulo, trabalhamos muito no período em que estávamos em San Antonio para encontrar um lugar legal e para isso caminhamos pela cidade conversamos com pessoas, fotografamos, discutimos até que conseguimos encontrar um espaço que agradou a todos no grupo. Depois desse intenso dia de atividade voltaríamos para escola, mas eu e um grupo de amigos decidimos ficar na cidade para aproveitar a sexta-feira por lá, comer uma comida diferente, ver gente diferente, beber e ir a uma festa de Halloween que teria no parque da cidade. (Parque esse muito raro).

Começamos bebendo umas cervejas, depois encontramos uma amiga cubana e ela nos levou para conhecer a estação de trem e o rio de San Antonio de los Baños (a cidade se chama assim porque todos iam banhar-se no rio por causa do seu poder curativo).  Depois de caminharmos pela cidade ela nos levou para comer em um restaurante muito gostoso, de comida criola, ali apesar do menu cubano não mudar nada de um lugar para outro, as vezes o sabor e o preço tornam o lugar mais atraente, esse restaurante nos encantou pela quantidade que comemos a um preço tão barato. Para falar a verdade eu comi tanto que até no domingo estava cheia e repugnando comida. Acreditem, eu serei a única a voltar de Cuba com mais peso do que cheguei, porque aqui só tem carboidrato, nunca na história da minha vida eu comi tanto arroz com feijão, é um Deus nos acuda!

Depois de comidos, lá fomos nós comprar um ron e caminharmos até a festa no parque de diversão da cidade. Chegando lá uma fila imensa, cheia de adolescentes e crianças, estava me sentindo numa matinê, mas e daí o importante era sair um pouco da escola e se divertir. Então lá fomos nós curtir a música eletrônica com os piá.

A minha surpresa foi quando nos aproximamos da porta de entrada do parque e fui recepcionada por dois monumentos imensos, de nada mais nada menos, que o Mickey e Minnie. A nossa cara de espanto tinha que ter sido fotografada naquele momento, estávamos na Disneylândia Cubana, e pior, brigando por espaço com um monte de adolescente fantasiado para poder entrar na festa e tirar fotos com as estatuas gigantes de personagens de desenhos.

Passado o sufoco da entrada, as fotos com os famosos desenhos, nos esbaldamos na pista de dança e curtimos a festa até as 2 da manhã quando a festa acabou e todos tiveram que deixar a Disneylândia Cubana e voltar para casa ou escola-casa.

Aí começamos outra aventura, a de como ir embora. O mal de quem bebe é que qualquer distância é pouca, estávamos a 7km da escola e uma grande parte do grupo queria voltar caminhando e outra queria chamar um taxi. Eu era do grupo do taxi, afinal de contas caminhar 7 km numa avenida deserta, escura e movimentada por maus motoristas cubanos não era muito seguro no meu ponto de vista. Mas enfim, aqui não é uma democracia, porém fizemos uma votação e ir a pé ganhou! Lá vamos nós começar a caminhada que tem muito chão pela frente. Uns 10 passos depois de começada a via crucis um caminhão saia da garagem e, claro, alguém teve a brilhante ideia de pedir carona.

Estávamos em 10 pessoas, três meninas e o resto meninos, ou seja, não era uma carona tão perigosa assim para gente, e aqui em Cuba esse tipo de transporte compartilhado é bem comum e seguro.  Para nossa salvação o caminhoneiro disse: "Sim, posso levar vocês até a escola de cine, sobe aí na carroceria". Para mim a aventura já começou na subida da carroceria, porque quem me conhece sabe que eu sou molenga e sedentária, logo não consegui subir com a mesma rapidez nem destreza que os outros, mas meus amigos me puxaram e foi até rápida minha escalada.

Imaginem uma noite fresca, com vento, um céu estrelado e deslumbrante. Aquele vento no cabelo, uma sensação de liberdade, de que estávamos voando em meio as estrelas, foi muito, muito maravilhoso. Todos nós gritávamos, riamos e tirávamos fotos, para tentar guardar aquele momento e aquela sensação que ninguém ia acreditar e nem mesmo a gente se não tivéssemos provas de que aquilo realmente aconteceu.

Cinco minutos de liberdade e o caminhão parou na frente da escola. O segurança da escola olha espantado aquele tanto de estudante descendo da boleia do caminhão, todo mundo feliz, gritando e agradecendo o caminhoneiro enquanto o segurança observa com uma cara curiosa e risonha tentando entender o que estava acontecendo ali. Por fim ele nos reconheceu, explicamos tudo e ele ainda nós olhava com espanto e riso e, para não perder a piada, perguntou: "Vocês vão a pé até a porta da escola ou querem um carro".  Foram uns 1,5 km de caminhada no escuro, somente vendo a escola de longe com suas luzes e ruídos de festa e para quem não caminhou os 7 km, foi fichinha.

Lá fomos nós cantando sem parar, tirando fotos, rindo, correndo, vendo o céu estrelado e recontando a história da carona entre nós mesmos para termos certeza que todos haviam sentido a mesma sensação de liberdade e que aquilo tinha sido real.

A gente ouvia as músicas das tão queridas festas de sexta no Rapidito e imaginávamos a cara de todo mundo olhando para gente chegando. Quanto mais se aproximava mais barulho e grito de guerra a gente ensaiava pra chegar causando na festa. E assim foi, chegamos todos juntos gritando, a festa começou a gritar pra gente, um monte de gente em volta perguntando como foi e arrependido de não ter ido.

Nunca vou esquecer o céu dessa noite e nem o vento no cabelo e sensação de liberdade e de coragem para dominar o mundo naquele dia. 

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